Tuesday, September 06, 2022

Apontamentos sobre Sociologia

 

Isabel Pires

A Sociologia é a ciência que estuda as sociedades humanas contemporâneas, seu modo de organização e os acontecimentos inerentes a ela, como problemas e realizações. Se comparada a outros campos do conhecimento, como a Filosofia, por exemplo, que tem raízes na Antiguidade Clássica, a Sociologia é uma ciência bastante recente. Embora o termo “sociologia” tenha sido criado por Augusto Comte na primeira metade do século XIX, a Sociologia, enquanto ciência autônoma e com uma metodologia própria, foi fundada somente na virada do século XIX para o XX, quando surgiram os trabalhos do francês Émile Durkheim e do alemão Max Weber.

 

Origens

 

A Sociologia se fundamenta em duas grandes correntes do pensamento europeu do século XIX: o Positivismo e o Marxismo.

 

O Positivismo, doutrina que teve o francês August Comte (1798-1857) como o seu maior representante, com o Curso de filosofia positiva, publicado entre 1830 e 1842, fundamenta-se na ideia de progresso constante e valorização da racionalidade. Deixando de lado as crendices e superstições que vigoraram durante todo o período do feudalismo, o pensamento positivista é herdeiro do Iluminismo, que vigorou no século XVIII, com a sua valorização exacerbada das “luzes”, isto é, das ideias “claras”, “racionais” e “científicas”. Embora o Positivismo, com sua “fé no progresso”, proponha a substituição da Teologia pela racionalidade da Ciência, aplicando às ciências sociais os métodos utilizados nas matemáticas para extrair leis que regem o desenvolvimento da sociedade, ele próprio passaria a constituir, no final da vida de Comte, uma nova proposta de religião – a “religião positiva”.

 

Por sua vez, o Marxismo, fundado por Karl Marx (1818-1883) e Friedrich Engels (1820-1895) na segunda metade do século XIX, originou-se de movimentos do operariado alemão e inglês. Alicerçado em bases científicas, o marxismo prega a abolição da propriedade privada e da sociedade de classes, e a substituição do capitalismo pelo socialismo e depois pelo comunismo. A principal obra de Marx – O capital, livro em três volumes – faz uma análise das condições históricas do fim do feudalismo e surgimento do capitalismo, e foi escrito em Londres, onde Marx exilou-se em 1849, após ser expulso da Alemanha devido às suas ideias políticas. Antes, porém, de se dedicar à escrita de O capital, Marx escreveu outros trabalhos, alguns em conjunto com o seu amigo e protetor Friedrich Engels, como A sagrada família (1845) e Manifesto do partido comunista (1848). Em dois outros trabalhos, escritos somente por Marx, encontram-se já as bases e conceitos mais importantes do marxismo, como os conceitos de alienação e de materialismo histórico: A ideologia alemã (escrito em 1845, mas publicado somente em 1932) e Miséria da filosofia (1847).

 

Como se pode perceber, estas duas correntes do pensamento europeu do século XIX – Positivismo e Marxismo – são extremamente diferentes entre si. No entanto, ambas influenciaram na formação da Sociologia e acabaram por gerar correntes dentro da própria ciência que estava se formando. Assim, podemos dizer que o pensamento sociológico se divide em duas correntes fundamentais, de acordo com as bases em que se sustenta: a corrente durkheimiana e a corrente weberiana.

 

A sociologia durkheimiana

 

Herdeiro do pensamento positivista de August Comte, o também francês Émile Durkheim (1858-1917) defende a ideia de que a sociedade é um corpo coeso, com vida independente dos indivíduos que a formam. Ou seja, a sociedade seria uma espécie de “organismo”, que, da mesma forma que os seres vivos, possuiria, “órgãos”, que desempenhariam, cada um, uma função específica. Podemos perceber, na visão de Durkheim sobre a sociedade, uma analogia com as ciências biológicas, que influenciaram o pensamento positivista. Durkheim criou ainda o conceito sociológico de “fatos sociais”. Segundo este conceito, os acontecimentos sociais devem ser tratados como “coisas” e estudados à maneira de uma análise de laboratório – o que constitui outra identificação com o Positivismo, que valorizava o ponto de vista da Biologia e ciências afins.

 

Outros conceitos fundamentais na sociologia durkheimiana são os de “coação social” e de “anomia”. Para Durkheim, o indivíduo isolado está sujeito às regras sociais, que exercem uma “força”, ou pressão, sobre o indivíduo para que este se ajuste à vida em sociedade. O estado de anomia, por outro lado, seria o instante em que a coação social deixaria de funcionar, levando a um estado de patologia na sociedade. Ainda segundo o ponto de vista durkheimiano, as sociedades modernas sofrem de anomia, pois, devido aos traumas dessas sociedades, que necessitam de uma estrutura social complexa, os seus indivíduos não estão perfeitamente ajustados a elas. Isto geraria diversos problemas, dos quais o suicídio seria um dos sintomas. As principais obras de Durkheim são: Da divisão social do trabalho (1893); Regras do método sociológico (1894); O suicídio (1897); As formas elementares da vida religiosa (1912).

 

A sociologia weberiana

 

Ao contrário de Durkheim, que leva em conta a preponderância da sociedade sobre o indivíduo, o alemão Max Weber (1864-1920) considera que é o indivíduo o agente por excelência da sociedade. A ação social, para ele, está condicionada à ação individual, uma vez que ele considera que a ação social é determinada pela “conduta dos outros” em sociedade. A conduta ética é, pois, fundamental no pensamento weberiano, pois dela decorre toda a vida em sociedade.

 

Embora o ponto de partida da vida em sociedade seja o indivíduo, a ação deste, porém, só pode ser levada em conta, para Weber, de acordo com a ação dos demais, o que exprime, deste ponto de vista, o fenômeno da vida em sociedade. Do ponto de vista weberiano, a sociedade humana constitui-se não apenas num “sistema social”, isto é, um sistema de vida coletiva, mas sobretudo a ação resultante dessa associação é dotada de sentido, sendo isto precisamente o que constitui a especificidade do estudo sociológico.

 

Weber critica ainda a analogia entre o sistema social e o sistema dos organismos vivos, pois, para ele, a base do estudo sociológico é um método fundamentalmente interpretativo, que não pode ser aplicado às ciências naturais. Essa base interpretativa é o fundamento da “sociologia compreensiva” de Weber.

 

Segundo Weber, os tipos de ação social se dividem em:

·         ação social racionalizada por fins: determinada por expectativas de fins racionalmente perseguidos, em que são avaliados os meios e as consequências;

·         ação social racionalizada por valores: determinada em razão da crença num valor, seja este ético, estético, religioso, etc. Pressupõe um planejamento consciente, em oposição à ação afetiva. Porém, em comum com esta, não busca o sentido no resultado alcançado, mas na própria ação;

·         ação social afetiva: determinada por estados sentimentais atuais. Poder ser uma reação a um estímulo extraordinário, fora do cotidiano;

·         ação social tradicional: determinada por um costume arraigado. Encontra-se na fronteira entre uma imitação puramente reativa e uma ação com sentido, aproximando-se ainda da ação social racionalizada por valores.

 

Ramos e conceitos da Sociologia

 

A Sociologia também se divide em vários ramos, relacionando-se ainda com diversos campos do saber. São alguns ramos da Sociologia, entre muitos outros:

 

. Sociologia do Conhecimento: estuda as condições sociais de produção do saber humano.

. Sociologia da Arte: estuda as várias formas de arte, como expressões da cultura humana.

. Sociologia da Economia: estuda as várias formas de sobrevivência das sociedades humanas, isto é, os modos-de-produção através dos quais uma sociedade é capaz de garantir a sua reprodução.

. Sociologia da Religião: estuda as diversas religiões presentes nas sociedades contemporâneas.

. Sociologia da Comunicação: estuda as diversas formas de comunicação das sociedades atuais.

 

Além disto, a Sociologia se utiliza de diversos conceitos em seu campo de estudo, de modo geral, tais como: grupos sociais, estrutura social, sociedade, sociedade ocidental, sociedade oriental, sociedades complexas, sociedades não-industriais, minorias, sistemas sociais, etc.

 

Sociólogos famosos

 

Além dos fundadores das principais correntes sociológicas, vários sociólogos deram importantes contribuições para o campo da Sociologia, desde as suas origens. Entre muitos, podemos enumerar: o inglês Herbert Spencer (1820-1903), o húngaro Karl Mannheim (1893-1947), o norte-americano Talcot Persons (1902-1979), os franceses Roland Barthes (1915-1980), Michel Foucault (1926-1984) e Pierre Bourdieu (1930-2002), e os alemães George Simmel (1858-1918), Theodor Adorno (1903-1969), Walter Benjamin (1892-1940), Max Horkheimer (1895-1973), Herbert Marcuse (1898-1979) e Jürgen Habermas (1929), sendo estes cinco últimos integrantes da chamada Escola de Frankfurt.

 

No Brasil, temos, como mais conhecidos, os sociólogos Gilberto Freyre (1900-1987), Sérgio Buarque de Holanda (1902-1982), Florestan Fernandes (1920-1995), Herbert de Souza, o Betinho (1935-1997), Antonio Candido (1918-2017) e Fernando Henrique Cardoso (1931).

 

Em resumo, a Sociologia, com seu vasto campo de estudo, que se relaciona com diversas áreas do conhecimento, como a Antropologia, a Filosofia, a Psicologia, entre outras, é uma ciência fascinante, que tem, em última instância, como objeto de análise, o fundamento primordial de toda sociedade humana: o próprio ser humano.

 

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