Série "entre aspas" III - Lévi-Strauss
"Nestes estabelecimentos em que o vinho está incluído no preço das refeições, cada conviva encontra diante de seu prato uma modesta garrafa com um líquido na maioria das vezes ruim. Esta garrafa é parecida com a do vizinho, como o são as porções de carne e de legumes que uma criada distribui à volta, e, entretanto, uma singular diferença de atitude se manifesta logo em relação ao alimento líquido e ao alimento sólido. Este representa as submissões do corpo e aquele, seu luxo. Um serve em primeiro lugar para alimentar, o outro para celebrar (...). É que, com efeito, diferentemente dos pratos do dia, bastante pessoais, o vinho é bastante social. A pequena garrafa pode conter exatamente um copo, o conteúdo será vertido não no copo daquele que o possui, mas no copo do vizinho, e este efetuará logo um gesto correspondente de reciprocidade. O que se passou? As duas garrafas são idênticas em volume, seu conteúdo semelhante em qualidade. Cada um dos participantes desta cena reveladora, no final das contas, não recebeu nada a mais do que se ele tivesse consumido sua parte pessoal. De um ponto de vista econômico, ninguém ganhou e perdeu. Mas acontece que existe muito mais na troca do que as coisas trocadas" (Lévi-Strauss, in: Les structures élémentaires de la parenté, 1947).
[Citado por Jean-Pierre Poulain, Sociologias da alimentação, trad. Rossana Pacheco e outros. Florianópolis: Ed. da UFSC, 2004, p. 162.]
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